Vinícius Nepomuceno Marra
A religião tem como objetivo vincular o mundo profano ao mundo sagrado, com isso podemos dizer que a religião tenta levar o homem a aproximar-se mais de Deus. No presente artigo, trataremos do conceito de religião especificamente para a religião revelada em Hegel. Segundo Hegel[1],
…do mesmo modo que a ciência é afim da filosofia, porque se refere ao conhecimento formal, assim a religião, precisamente porque diz respeito ao conteúdo, é o oposto deste mundo, e se aproxima da filosofia, por se da como objeto, não o terreno, nem o mundano, mas o infinito (HEGEL, 1980, p.360).
Podemos dizer que a filosofia juntamente com a religião busca levar o homem a entender as coisas superiores a ele mesmo, ou seja, que estão para além do nosso mundo. Com o desenvolvimento do mundo, da cultura, a religião também se desenvolve juntamente com a filosofia,
mas a religião, na sua essência, mantém firmes os mais elevados valores em contraposição aos fins temporais, e sobre aqueles constrói uma religião sublime, santuário da verdade onde se dissolvem as ilusões do mundo sensível, das representações, dos fins limitados, da esfera das opiniões e do arbítrio (HEGEL, 1980, p.361).
A religião usufruiu da arte para revelar a essência divina que se encarnou, fazendo-se homem. Assim, podemos dizer que “a essência divina se humanava já na estátua” (MENESES, 1985, p.188). A religião usa a própria arte, para apresentar Deus à humanidade, “mas só na forma exterior, pois a atividade se situava fora dela” (MENESES, 1985, p.188).
A religião necessita de um espírito para ser conduzida, mas este espírito deve primeiramente conhecer-se a si próprio para em seguida conhecer o próximo. A “filosofia apóia-se nas mesmas bases da religião, enquanto o objeto de ambas é idêntico, isto é, a razão universal existente em si e por si”. (HEGEL, 1980, p.361). Sendo o espírito aquele que orienta a religião, ele deve em primeiro lugar ter consciência de si próprio, para fazer com que essa religião seja revelada com clareza a todos os povos. É complicado o homem ter conhecimento do próprio Deus, mas através do espírito que rege a religião, e até mesmo do espírito que rege o próprio homem, é possível que o homem tenha conhecimentos das várias qualidades que Deus possui. O espírito absoluto envia através de um homem, a sua própria essência, com isso o nosso mundo, melhor dizendo,
a fé do mundo é [crer] que espírito “é-aí” como uma consciência-de-si, quer dizer, como um homem efetivo; que o espírito é para a certeza imediata; que a consciência crente vê e toca e ouve esta divindade. Assim, essa consciência-de-si não é fantasia, mas é efetiva no crente (HEGEL, 1988, p.188).
A religião é revelada através da consciência-de-si, ou seja, através do espírito divino. Nos cultos, nas celebrações que acontecem em várias religiões, o espírito se manifesta no homem de forma exterior e principalmente de forma interior,sendo assim, há uma junção do exterior com o interior.
O espírito é sabido como consciência-de-si, e é imediatamente revelado a esta consciência, pois é a própria; por isto se diz que a natureza divina é o mesmo que é a humana: e é esta unidade o que se contempla (HEGEL, 1980, p.190).
Sendo assim a religião e o homem estão ligados entre si, pois ambos possuem espírito, e é através do espírito que se dá movimento ao homem e a religião. Sendo o espírito o responsável por revelar a religião, podemos dizer que a religião é um saber caracterizado por ela mesma, pois Deus se revela a todos como ele é realmente.
A humanidade cria expectativas diante das religiões, para que a essência absoluta seja revelada, com isso o espírito “se revela na Religião sob uma forma imediata, a de um Si singular oposto ao universal, a forma de um Outro sensível” (HEGEL, 1980, p.191). Como já vimos, é o ser absoluto que envia o ser sensível para habitar no mundo, e é através da religião que o ser sensível é revelado. O ser sensível está presente nas comunidades, levando o homem a se interiorizar e a refletir dentro de si próprio, para que ele possa conhecer o Espírito Absoluto, porém são poucos os que possuem o conhecimento desse Espírito Absoluto.
Então, podemos dizer que a religião tem como propósito fazer com que o homem se aproxime cada vez mais de Deus. No cristianismo a revelação de Deus por meio de Jesus Cristo na Sagrada Escritura, nos foi transmitida por pessoas ao longo da história, tendo como objetivo principal conduzir as pessoas a Deus, e podemos perceber que as variadas religiões possuem seus variados modos de conduzir o homem a experimentar Deus, mas é necessário que o homem tenha como premissa a crença em Deus diante daquilo que foi revelado. Com isso observa-se que é por meio da fé e simplesmente por ela que o homem é capaz de ser conduzido de fato a Deus.
Referências
HEGEL, G. W. F. Fenomenologia do Espírito. Petrópolis: Vozes, 1988.
________. Fenomenologia do Espírito. São Paulo: Abril Cultural, 1980.
MENESES, Paulo. Para ler a fenomenologia do espírito. São Paulo: Loyola,1985.
[1] Nasceu em Stuttgart na Alemanha no ano de 1770. Estudou filosofia e teologia, e devido o seu interesse pelos problemas religiosos e políticos, resolveu aprofundar seus estudos, podendo assim dar aulas em algumas universidades alemãs. Suas principais obras são: Fenomenologia do espírito (1807); Ciência da lógica (1812-1816); Enciclopédia das ciências filosóficas (1817). Ele foi um gênio poderoso, com uma cultura vastíssima e teve uma belíssima capacidade sistemática. Hegel acreditava que os homens seriam capazes de realizar várias coisas, ele veio a falecer em Berlim na Alemanha, no ano de 1831.
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O texto está interessante, parabéns!!! Gostaria de saber se possível, vc que estudou esse tema mais afinco, se há a possibilidade de uma aproximação entre Deus e o Espírito Absoluto do qual Hegel menciona? Ambos são a mesma coisa?
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Boa reflexão! Parabéns…
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A abordagem foi tao interessante e continuem assim!mais qual foi o motivo que levou hegel a dedicar seus estudos a religiao?
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Quem encerrou o assunto religiosidade foi Nietzsche ao compará-la à feiticeira Circe que transformou os companheiros de Ulisses em porcos. Sendo a religião o braço direito do pão e circo que entorpece a humanidade, tornando-a incapaz de superar os infortúnios evitáveis mediante ação nesse sentido, procede do mesmo modo que irracionais, entre eles os porcos.