Edivaldo de Oliveira Ribeiro
O presente artigo terá por objetivo falar sobre o tema da linguagem, conforme compreendida no pensamento de Gadamer, como o ponto central do ser humano. Então, ao propor este tema é necessário que se fale, também, sobre o homem, uma vez que a linguagem só pode existir por causa do homem e para o homem.
Neste sentido, Aristóteles classifica o homem como o ser vivo que possui “logos” (zoón logikón) sendo essa definição canonizada na tradição ocidental com a forma de que o homem é o animal racional, o ser vivo racional, o ser que se distingue de todos os outros animais pela capacidade de pensar.
Porém, a palavra “logos”, em sua origem, se expressa no sentido de razão, pensar, mas significa também linguagem. Ao definir o homem como zoón logikón, Aristóteles estabelece uma diferença entre o homem e o animal. Os animais possuem a capacidade de se entenderem mutuamente agindo de acordo com seus instintos sendo a eles permitido pela sua natureza chegarem somente a esse ponto. Ao contrário, ao homem foi dada a capacidade do “logos”, isto é, o homem é o único ser que possui a capacidade de raciocinar, pensar e falar. Por meio desta capacidade ele consegue dominar os seus instintos. “Pela fala o homem tem a capacidade de comunicar tudo o que pensa”[1]. Falar aparece aqui no sentido de tornar visível ao outro, pela sua fala, algo que esteja ausente de modo que o outro também possa vê-lo.
No entanto, a linguagem não constitui o ponto central do pensamento filosófico do ocidente. Embora o Antigo Testamento chame a atenção para o fato de Deus ter entregado ao homem o domínio do mundo dando-lhe poder para nomear os seres como melhor lhe conviesse, fora “justamente a tradição religiosa do Ocidente cristão a principal e única responsável pela paralisação do pensamento acerca da linguagem.”[2]
Na época do Iluminismo a pergunta pela origem da linguagem segue um novo sentido. A partir daí, a linguagem passa a ser respondida não mais pelo relato da perspectiva histórica da criação, mas a partir da própria natureza do homem. O que definiu este novo horizonte da linguagem foi admitir no homem uma faculdade esclarecedora do regimento estrutural, a qual nós chamamos de gramática, sintaxe, vocabulário da linguagem. Com esse modo de pensar, o fenômeno da linguagem adquire o significado de um campo de expressão eminente, no qual é possível estudar a essência do homem e sua evolução na história. No entanto, por esta via, não é possível penetrar nos postulados centrais do pensamento filosófico porque a definição cartesiana de consciência como autoconsciência encontra-se no pano de fundo de todo pensamento moderno.
E na filosofia contemporânea a filosofia da linguagem chega a seu ápice. Segundo Gadamer, “a palavra “logos” significa não apenas pensamento e linguagem, mas também conceito e lei”[3], ou seja, o conceito da linguagem pressupõe uma consciência da liguagem que quer dizer um movimento reflexível no qual o sujeito pensante reflete a partir da realização inconsciente da linguagem. O verdadeiro enigma da linguagem, porém, é que isso jamais se deixa alcançar plenamente. “Todo pensar sobre a linguagem, pelo contrário, já foi sempre alcançado pela linguagem”[4].
Nos nossos pensamentos e conhecimentos somos sempre precedidos pela interpretação do mundo feita por meio da linguagem. Nesse sentido, a linguagem expressa nossa real e verdadeira finitude. Todo indivíduo, porém, quando se expressa ou fala não possui uma verdadeira consciência daquilo que está expressando, falando. Quando temos em mente algo para dizer e nos vem à memória uma palavra que soa estranha, nos perguntamos: “pode-se dizer isso?”. É nesse momento que a linguagem que falamos torna-se consciente por não fazer o que é “seu próprio”. Para entedermos o que seria esse “seu próprio” é necessário, pois, dividí-lo em três apectos:
O primeiro é o esquecimento de si mesmo de que advém a linguagem. A linguagem viva não tem consciência de sua própria estrutura, gramática, sintaxe, etc., isto é, de tudo aquilo que a linguagen tematiza. Mas “o verdadeiro sentido da linguagem é aquilo que adentramos quando a ouvimos: o dito”[5].
O segundo é a ausência de um eu. Nesse sentido, o falar não pertence ao eu, mas a nós, pois quem fala uma língua que ninguém compreende, simplesmente não fala nada. Falar significa falar a alguém. A palavra quer ser palavra que vai ao encontro de alguém. A realidade do falar consiste no diálogo.
E o terceiro aspecto pode-se chamar de universalidade da linguagem. A linguagem não constitui um âmbito fechado do que pode ser dito, pois ela é oniabrangente.
Assim, segundo Gadamer, pode-se dizer que:
a linguagem é, pois, o centro do ser humano, quando considerado no âmbito que só ela consegue preencher: o âmbito da convivência humana, o âmbito do entendimento, do consenso crescente tão indispensável à vida humana como o ar que respiramos. Realmente o homem é o ser que possui linguagem segundo a afirmação de Aristóteles. Tudo que é humano deve poder ser dito entre nós[6].
A partir de tais fatos, conclui-se que a linguagem é o ponto central do ser humano. É a partir dela que o homem se faz presença e possui a capacidade de agir no mundo e interagir com o mesmo. O homem é, de fato, um ser vivo dotado de linguagem.
Referências
GADAMER, Hans-Georg. Verdade e Método II: Complementos e índice. Tradução de Ênio Paulo Giachini. Petrópolis: Vozes, 2002.
#
Parabéns Edivaldo, seu texto ficou muito bem escrito.
Porém, uma coisa me inquieta sobre o pensamento de Gadamer, quando ele afirma que: “a linguagem é, pois, o centro do ser humano, quando considerado no âmbito que só ela consegue preencher: o âmbito da convivência humana, o âmbito do entendimento, do consenso crescente tão indispensável à vida humana como o ar que respiramos”. Parece que quando ele fala da linguagem esta falando da linguagem verbal – pelo que eu entendi, mas quando pensamos que esta linguagem é o centro do ser humano, estamos afirmando algo universal. Diante disto, como fica as pessoas que não podem falar, através desta linguagem verbal.
#
Edivaldo, parabéns seu texto ficou muito hermenêutico. Com relação ao comentário anterior, ou melhor, questionamento filosófico. Gostaria de dizer que a linguagem em Gadamer não pode ser compreendida somente no sentido verbal, isto seria, se asssim podemos dizer, um reducionismo linguistico com relação ao pensamento de Gadamer. Na verdade, Gadamer compeende a linguagem não somente como capacidade linguistica verbal, mas como toda forma que o ser humano encontra para se expressar. Ao pensar que a linguagem é somente capacidade de se expressar verbalmente, estamos inseridos na linguagem enquanto semântica, ou seja, somente como “mera” descrição do mundo. Esta característica, ou forma de pensar a linguagem encontra sua expessividade nos pensadores da chamada corrente semântica, dentre os quais destaco, Frege,”o primeiro” Wittgenstein dentre outros. Assim fica esclarecido que a linguagem, no que refere ao pensamento de Gadamer está imersa no círculo hermenêutico, o que por sua vez nos mostra que a lianguagem não é só palavra, mas possibilidade de significação, de sentido, ” o olhar por exemplo já sujere várias possibilidades de interpretações, embora ele não seja linguagem verbalizada.” Assim podemos afirmar que a linguagem em Gadamer é o tempo todo hermenêutica e não semântica.
#
Muito bom viu ja ta me ajudando na Faculdade esse otimo pensamento pra criar varias perguntas nos debates e atividades realizadas.