Alan Lopes de Oliveira
Na chamada pós-modernidade percebemos que não há nenhum conhecimento legitimado, a nosso ver, de modo definitivo. A questão do saber absoluto perdeu sua credibilidade, pois notamos não mais um único saber como fonte de todo conhecimento, e sim uma gigantesca gama de saberes relativos. Na chamada pós-modernidade, vemos anunciar-se uma impossibilidade de qualquer pretensão no que se refere ao saber, de absolutização. Neste aspecto vemos presente no mesmo período uma crise de saberes absolutos e a afirmação da precariedade dos mesmos, o que por sua vez possibilita uma pluralidade de saberes sem que nenhum dos mesmos se autoproclame como verdade absoluta.
Um grande fator que ajudou no declínio do saber foi o desenvolvimento das técnicas e das tecnologias a partir dos meados do século XX. Mas, podemos levar em consideração que a questão da razão já começa a sofrer seu declínio a partir da revolução industrial, pois, a partir da mesma se nota um conjunto de mudanças tecnológicas, com grande impacto no processo produtivo, no nível econômico e cultural. A revolução industrial teve seu início na Inglaterra em meados do século XVIII, e se expandiu pelo mundo a partir do século XIX. Nesse período a máquina foi implantada, e com isso suplantando o trabalho humano, surgiu o fenômeno de “cultura de massa” e o capitalismo tornou-se o sistema econômico vigente. Após o avanço tecnológico e também a prosperidade capitalista, o período da pós-modernidade não consegue mais solidificar um saber como fundamento.
Levemos em consideração que aconteceu a deslegitimação do saber especulativo hegeliano, pois este contém de modo inerente um ceticismo em relação à ciência verdadeira, por não ter descoberto uma legitimidade não é uma ciência verdadeira. Para o saber especulativo, a legitimidade do discurso cientifico deve se dar no próprio jogo da linguagem especulativa:
Surge assim a idéia de perspectiva que não é distante, pelo menos neste ponto, da dos jogos de linguagem. Tem-se aí um processo de deslegitimaçao cujo motor é a exigência de legitimação. A “crise” do saber científico, cujos sinais se multiplicam desde o fim do século XIX, não provém de uma proliferação fortuita das ciências, que seria ela mesma o efeito do progresso das técnicas e da expansão do capitalismo. Ela procede da erosão interna do principio de legitimação do saber. Esta erosão opera no jogo especulativo, e é ela que, ao afrouxar a trama enciclopédica na qual cada ciência devia encontrar seu lugar, deixa-as se emanciparem. (LYOTARD, 1998, p.71)
Desse jeito, no período pós-moderno acontecem várias modificações nas delimitações clássicas dos campos científicos: disciplinas desaparecem, os limites das ciências se cruzam aparecendo assim novos conhecimentos, a hierarquia especulativa dos conhecimentos é substituída por uma horizontalidade, faculdades se tornam institutos e por sua vez as universidades perdem sua função de legitimação especulativa, gerando mais professores que cientistas.
Em outro processo, na deslegitimação do dispositivo de emancipação – Aufklärung – também está um poder interno de erosão. Ora, se o discurso científico não pode ser considerado como verdadeiro, pois tudo são jogos de linguagem, também o discurso de emancipação não pode ser justo, na medida em que é guiado pelo saber científico. A característica de fundamentar a legitimidade da ciência, desvelando a verdade para proporcionar a autonomia social, política e ética aos interlocutores. Lyotard afirma:
Ora, esta legitimação, […], constitui de imediato um problema: entre um enunciado denotativo de valor cognitivo e um enunciado prescritivo de valor prático, a diferença é a pertinência, portanto de competência. Nada prova que, se um enunciado que descreve uma realidade é verdadeiro, o enunciado prescritivo, que terá necessariamente por efeito modificá-la, seja justo. (LYOTARD, 1998, p.72)
Essa divisão da razão cognitiva e prática, entra em choque com a tentativa da legitimidade do discurso cientifico, mostrando assim, que ela também é um jogo de linguagem, com características (regras) próprias, mas sem o dom de regulamentar o jogo prático, sendo, então, mais um jogo de linguagem entre outros.
Podemos então apontar as principais implicações da deslegitimação dos metarrelatos apontados por Lyotard, são elas: a ciência não pode legitimar mais a si própria e nem a outros jogos de linguagem; a dispersão dos jogos de linguagem anula o sujeito e torna a linguagem o vínculo social; o fracasso do dispositivo filosófico especulativo moderno como discurso de legitimação e sustentação do projeto emancipatório; a mudança dos sábios em cientistas com um conhecimento fragmentário; a filosofia especulativa humanista adquire o estudo da lógica ou da história das idéias; o aparecimento de um pessimismo generalizado, pois nenhuma pessoa domina todos os jogos de linguagem e não há uma meta-língua universal; a superação do pessimismo positivista por Wittgenstein, averiguando os jogos de linguagem em uma nova perspectiva de legitimação distinto do desempenho, característica do mundo pós-moderno onde não há mais nostalgia com o fim dos metarrelatos e nem a confiança no amanhã como barbárie.
Percebemos que na pós-modernidade há várias formas de conhecimento e com isso várias linguagens, mas sabemos também, que não conseguimos abarcar todas essas linguagens de conhecimento, não possuímos uma metalíngua-universal, conforme sugere Lyotard. Com isso alguns se voltam para áreas particulares do conhecimento fazendo assim que o crescimento do conhecimento se amplie, mas de forma particular e em vastas áreas, dessa maneira se dá a deslegitimação do saber. Não sabemos se é possível legitimar agora ou posteriormente um novo tipo de conhecimento como saber absoluto, pois o que percebemos é que as técnicas as ciências estão em processo de ampliação e não de retroação.
Referências
LYOTARD, Jean François. A condição pós-moderna. 5ªed. Trad. Ricardo Correia. Rio de Janeiro: José Olympio, 1998.