Marcos Vinícius Ramos Reis
Certa vez, perguntado se acreditava em Deus, Albert Einstein respondeu: “Acredito no Deus de Espinosa”.
Algumas divergências de opiniões Filosóficas e religiosas provocaram a excomunhão de Espinosa (1632-77) pela comunidade judaica de Amsterdã em julho de 1656. Tais opiniões se fundamentavam em sua concepção de “Deus e sua imanência no mundo”. Os estudos que Espinosa obteve no ciclo da Cabala judaica o ajudaram a esquematizar e fundamentar a Filosofia e dar novas diretrizes à própria Cabala, racionalizando assim a confusa e simbólica linguagem, dando a ela uma visão matemática e geométrica dos conceitos.
A Cabala ou Kabbalah (קבלה) é uma palavra de origem hebraica que significa recepção. É um sistema religioso-filosófico que investiga a natureza divina. É uma forma antiga de misticismo judaico, que consiste inicialmente em uma doutrina empírica. A Cabala afirma que “Deus é o lugar – morada do universo; mas o universo não é o lugar – morada de Deus”. Porque Deus abarca o universo, mas ele próprio não é abarcado por nada.
Espinosa devia ter esta passagem em sua mente quando disse que os antigos judeus não separavam Deus do mundo. Esta concepção de Deus pode ser panteísta. Isto também postula a união do homem com Deus; ambas as idéias foram posteriormente desenvolvidas na Cabala mais recente. Esclareceremos um ponto da concepção mística de Espinosa, pois tais conceitos que influenciaram a sua visão mística de Deus e do mundo não consistem em um caráter de revelação ou um transe espiritual, mas em uma mística meditativa que, de acordo com a explicação de Zilles (2005), é o grau de amadurecimento intelectual que o ser humano alcança por meio da razão. Espinosa “amadurece” a Cabala da mesma forma que os antigos sábios hebraicos, dando a ela uma nova interpretação mística do Antigo Testamento com sua filosofia cartesiana.
Segundo Marilena Chauí (1999), encontramos a sua mística cabalista na noção de imanência de Deus no mundo, por meio de um intelecto infinito imediato, uma emanação divina, que os cabalísticos chamavam de Adão Kadmon, Messias ou Cristo. A partir de uma tradição gnóstica, neoplatônica e jônica da preexistência do logos à criação do mundo por Deus, remete ao Verbo Divino, o Homem Celeste ou Mediador. Cristo seria o mediador entre Homem e Deus ou Logos ao Uno.
Para Espinosa, não era preciso conhecer a carne (nesse caso “Jesus Cristo”), mas sim o espírito, “Verbo Divino ou Intelecto de Deus”, a sabedoria na qual não há beatitude. Pois, em sua decorrência ontológica, Jesus era um modo finito do pensamento e da extensão (a manifestação da carne). Assim não pode se identificar com um modo infinito do pensamento “Verbo divino”. Jesus não era interpretado como o filho, mas como o Deus que está presente entre os homens, sendo esse um contraponto ao modo oral que Moisés e os profetas tiveram, pois o contado que eles obtiveram foi com o Intelecto de Deus. Essa ideia apresenta-se como base para a concepção mística de Espinosa.
Assim, para uma melhor compreensão, a noção de “substância” sistematiza toda a visão cabalística de Espinosa. Para Julián Marías (2004, p. 252), substância se entende como aquilo que “ não precisa de nada para existir, e, a rigor, só Deus poderia ser substância…”. Deus consiste em uma substância, mas uma “substância absolutamente infinita”. As demais coisas que se originam a partir dela são denominadas “atributos”. Os atributos são as imanências de Deus no mundo, o qual contém uma essência eterna e infinita. Esses atributos são em si o “Verbo Divino”, onde a sua real importância não consiste em conhecer o seu corpo mais sim em seu espírito.
Com isso, o pressuposto para alcançar a Alma do Mundo ou o intelecto infinito mediato é através do auto-conhecimento. E, por isso, há a necessidade de se auto-conhecer – “Conheça a ti mesmo”. Tal é um retorno ao Uno, que é o encontro com sua “Imagem e semelhança” e que a Cabala denomina o encontro do Homem com Deus. Essa interioridade é alcançada através do amor intelectual da alma por glória de Deus, no qual a glória é o sinal da Divina Presença que consiste no Deus pessoal e nos remete não mais a simples criaturas, mas a parte do Criador. Espinosa satisfaz, ao mesmo tempo, os anseios do coração e da razão, colocando o homem no mesmo pedestal que Deus quanto ao conhecimento. Pois nossa inteligência vem de Deus, e não pode senão levar-nos a Deus.
Assim, a filosofia de Espinosa é o paradoxo de um racionalismo absoluto que sacia os desejos da religiosidade plena. Um desejo místico que sacia em plenitude o simples florescimento da razão. É uma mística sem mistérios, fundado sobre a transparência do Homem para si mesmo e de Deus para o Homem. Sendo o conhecimento formado por meio de uma busca intelectual, da busca de si próprio para conhecer a Deus. O Deus de Espinosa consiste em um Deus pessoal, que o homem encontra a partir de um pensamento racional e livre de dogmas e especulações. Consiste, assim, em um Deus singular e natural. Segundo Humberto Mariotti (2004, p.2), “Ele é a própria Natureza, o conjunto de todos os seres, vivos ou não, isso evidentemente inclui os seres humanos, suas mentes e seus corpos. Daí a conhecida expressão espinosiana: Deus sive Natura (Deus, isto é, a Natureza)”.
Referências
CHAUÍ, Marilena. A nervura do real: Imanência e liberdade em Espinosa. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.
LEVI, Eliphas. Os mistérios da Cabala. São Paulo: Ediouro, 1991.
MARÍAS, Julián. Historia da Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2004.
MARIOTTI, Humberto. O conhecimento do conhecimento: A filosofia de Baruch de Espinosa e o pensamento complexo. São Paulo: Palas Athena, 2004.
URBANO, Zilles. Teoria do conhecimento e Teoria da Ciência. 2ª ed. São Paulo: Paulus, 2008.
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A teoria de Espinosa sobre “Deus e sua imanência no mundo” me proporcionou algumas reflexões e análises sobre a liberdade de pensamento, aberto à reflexão e ao progresso das idéias. A racionalidade empregada aos estudos deve servir para que os seus conteúdos nos levem a um próposito maior, o “amor à sabedoria”, sabedoria esta que emana de um Universo tão grandioso que ainda não temos a condição de entendelo, criamos mediações meios de captar a essência maior que nos supri. Ao longo da evolução, a percepção do homem sobre o mundo foi se aprimorando, descobriam na física as Leis que movem o mundo como a Lei da Gravidade etc.,na biologia percebemos os ciclos da vida,os sistemas que nos mantem vivos e muitas outras descobertas. Estamos ainda aprendendo a viver em grupo e em sociedade, questionamos nossa existência e percebemos pela pesquisa e pela razão, que esse Universo que se move como uma orquestra perfeita, não poderia existir sem uma força maior, tudo faz parte de um conjunto, de uma grandiosidade como diz Espinosa “substância absolutamente infinita”. Morrim nos fala do macro e do microcosmos que são parte integrantes, tudo pertencem a mesma esfera, somos compostos das mesmas substâncias e somos seres interligados e não dissociados da natureza. Nessa concepção,Somos todos “iguais” idistintamente, somos todos parte integrantes do universo,e temos o universo dentro de nós, quimicamente somos feitos da mesma matéria.
Os sábios nos ensinaram que mente e corpo para se manter em equilibrio teria que está em sintonia e harmonia com a natureza e o universo interior, eles percebiam que não eramos seres dissociados, que nossa saúde fisica e mental estavam em ligação direta com o universo a nossa volta. Jung nos propós a busca do SELF, através do auto-conhecimento e do burilamento da alma, para podermos encontrar nosso equilibrio e a sintonia com a natureza divina em nós.
Pude encontrar em Espinosa a razão que nos guia para um aprimoramento maior do Ser, assim como mencionou o autor “nossa inteligencia vem de Deus, e não pode senão levar-nos a Deus”.