Gustavo Moreira Mendes
Nós muitas vezes nos surpreendemos com diversas sacolas cheias. Isso acontece na maioria das vezes após um passeio pelo centro da cidade ou uma visita rápida ao shopping com aquelas famosas frases: vou só ao cinema ou passei só para conferir os preços e comprar um produto qualquer no supermercado. Ou talvez às vezes ao término da semana após o expediente de trabalho somos convidados a uma visita a um barzinho para darmos aquela famosa relaxada da dura semana e nos aventurarmos nas vitrines e nos sabores que iluminam e dão novos ânimos a todo esgotamento vivido.
De fato podemos constatar que de uma forma ou de outra somos afetados por essa forte influência do consumismo. Para mergulharmos nesse contexto do “sujeito consumista” e suas consequências, percorreremos o caminho do filósofo Theodor Adorno em suas reflexões sobre a indústria cultural.
Dentre as discussões apresentadas por Adorno, podemos destacar como grande expoente o “consumismo”. Assim podemos considerar:
O filósofo afirma que, nas sociedades contemporâneas, as produções do espirito, ou seja, as manifestações culturais se transformaram em mercadoria, isto é, estão subordinadas ao lucro e ao consumo. No desenvolvimento desse processo histórico, as produções culturais tiveram que se adequar ao mercado e a necessidade de sobrevivência, o que fez com que assumissem o caráter de mercadoria (FERREIRA, 2010, p. 29).
O trabalhador, após sua jornada de trabalho, procura satisfazer-se, procura nas diversões uma forma de compensação das horas “sofridas” e pesadas em seu trabalho, com isso buscando encontrar sentido para sua rotina muitas vezes cansativa e exaustiva. Basta olharmos os cartazes das propagandas e comerciais: são pessoas com sacolas nas mãos e um belo sorriso. Um cenário encantador que comove a todos indistintamente. Todos nós, crianças, jovens, adultos e idosos vivemos essa encantadora missão: consumir.
Homens e mulheres se veem presos a esse fascínio que o mercado oferece e o bem que o mesmo promete trazer. Consumo e diversão se atrelam:
A diversão é o prolongamento do trabalha sobre o capitalismo tardio. Ela é procurada por quem quer escapar ao processo de trabalho sob o capitalismo tardio. Mas, ao mesmo tempo, a mecanização atingiu um tal poderio sobre a pessoa em seu lazer e sobre a sua felicidade, ela determina a tão profundamente a fabricação de mercadorias destinadas a diversão, que esta pessoa não podem mais perceber outra coisa senão as cópias que reproduzem o próprio sucesso de trabalho. O pretenso conteúdo não passa de uma fachada desbotada; o que fica gravado é a sequência automatizada de operações padronizadas. Ao processo de trabalho na fabrica e no escritório só se pode escapar adaptando-se a ele durante o ócio. Eis aí a doença incurável de toda diversão (ADORNO, 1977, p. 113).
A constante busca pelo prazer e o bem pessoal se torna uma necessidade para o sujeito. É pequeno o número de pessoas em nossa sociedade que passe suas horas de “folga” envolvidas em atividades educativas. Isso exige reflexão, e esta implicará certo esforço, porém as pessoas desejam “prazer”, pois se encontram exaustas após a jornada de trabalho.
Essa distinção entre o trabalho e tempo livre foi embutida como regra no consciente das pessoas. De acordo com essa regra, o tempo livre tem como função repor as energias gastas nesse processo, para que o trabalhador possa fazer ainda mais seu trabalho, e por esse motivo, o tempo livre não deve jamais lembrar o trabalho (FERREIRA, 2010, p. 32).
Então podemos nos perguntar: Como podemos gastar nosso tempo “livre”? Como vivenciarmos o prazer das horas de ócio? Somos livres de fato em nosso “tempo livre”?
Afinal de cada expediente é comum se escutar: “estou livre” ou “graças a Deus a prisão acabou”. Muitas vezes nos consideramos escravos ou homens e mulheres presos. “A integração do tempo livre é alcançada sem maiores dificuldades; as pessoas não percebem o quanto não livres se sentem, porque a regra de tal ausência de liberdade foi abstraída delas” (ADORNO, 1977, p. 105).
A ocupação do nosso tempo deve ser encarada de maneira mais séria, procurando observar nossos acervos culturais, nossa disposição à apreciação de artes, música e nos lançarmos às diversas manifestações culturais presentes em nossa sociedade de modo mais autentico.
Como seria bom se cultivássemos um maior apreço ao teatro, à dança, ao lazer familiar ao ponto de resgatarmos em nós os fragmentos dos valores culturais e sociais perdidos em nossa história, nas histórias de nossas comunidades, de nossas ruas e favelas, histórias que formaram a “cultura de nossa gente”.
Por isso, cabe a nós cidadãos do novo mundo lançar um olhar para toda essa realidade presente e nos questionarmos acerca de nossa atuação nesse mercado tão consumista e se de fato estamos contribuindo para que o consumismo desenfreado aconteça em nossa sociedade.
A decisão nossa nas cenas dos próximos rumos da história implica consumirmos com responsabilidade, ou nos aventurarmos em caminhos tortuosos de uma eterna fantasia mergulhando-nos em um vazio que não gera a tão e preciosa liberdade. A escolha é nossa, é preciso saber o que escolher e como escolher. Boas compras!
Referências
ADORNO, Theodor W. A indústria Cultural. In: COHN,G. (org.). Televisão, consciência e indústria cultural. São Paulo: Nacional, 1997.
FERREIRA, Júlio César. A influência da indústria cultural na sociedade contemporânea através dos meios de comunicação em Theodor Adorno. Trabalho de conclusão de curso (Graduação em Filosofia) – Faculdade Arquidiocesana de Mariana, Mariana, 2010.
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É necessário pontuar que, para haver a indústria cultural, é necessário que haja um sociedade de consumo. O mass media não se resolve sozinho em indústria cultural. Havendo uma sociedade do consumo, a transformação da cultura em mercadoria e da mercadoria em cultural, feita pela indústria cultural, se torna mais evidente e, desta forma, demonstra que a solução para “burlar” a indústria cultural não é “encarar de maneira mais séria” a ocupação do tempo livre, pois, simplesmente encara de maneira mais séria nos leva à um policiamento sem saber do que se está policiando.
A indústria cultural é o aparelho de reprodução ideológica perfeito. Levar mais a sério a ocupação do tempo livre seria quase como reconhecer a transformação da cultural em mercadoria e da mercadoria em cultura. Eu creio que, antes disso, antes de levarmos a sério o nosso tempo livre, precisamos identificar a ideologia aí operante. O fato do tempo livre ser ocupado por atividades para o descanso do trabalho e que, em si, pedestalizam o trabalho, já que elas são o consumo daquilo que é trabalhado durante a semana, é um fenômeno social, porém, em âmbito individual, nós conseguimos encontrar sujeito que, mesmo ao agir desta maneira, não estão imersos na ideologia. Isso leva a um ponto que eu acho muito interessante: simplesmente existir já transforma o sujeito em reprodução da ideologia hegemônica.
Eu creio que a questão deve ser: como se expressar de maneira onde a sua existência no corpo coletivo não seja a reprodução da ideologia dominante?
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É muito dificíl ir de embate à cultura vigente! Podemos até nos sentir oprimidos pelo sistema, mas pouco ou nada podemos fazer! às vezes dói saber que em razão de até o lazer e a cultura hoje serem comercializados pela industria cultural, muitos deixam de participar da vida culta e dos moentos de lazer, mas o que podemos fazer? Gostaríamos de barrar este consumismo desenfreado, mas o que podemos fazer? Hoje para acompanharmos este mundo, se estivermos sem um celular em mãos ou antenados em um facebook acabamos por ficar sem acesso às infomrações e ao que está passando o mundo!
Mas é isso preciso lutar paulatinamente, que um dia, a ordem dos fatores se inverte e chega onde queremos! Um sistema não se implanata da noite para o dia e também não será da noite para o dia que ele deixará de vir abaixo!
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Sugiro que leia o poema “EU, ETIQUETA” de Carlos Drummond de Andrade. Creio ser muito correlato ao seu texto (muito agradavel por sinal de se ler)
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Gustavo Moreira Mendes, vc foi intuitivo, simples e direto. Parabéns.