Elder Alves Diniz
Na filosofia, vários foram os pensadores que abordaram Deus como assunto atribuindo-lhe definições diversas. O presente artigo tem por finalidade explicitar a concepção de Deus no pensamento de Spinoza.
Segundo Spinoza, Deus é a substância:
[…] a Substância que tem causa em si, […] que existe por si e em si, que é concebido em si e por si e que é constituído por atributos infinitos, infinitos em seus gêneros e cada um deles exprimindo uma das qualidades infinitas da substância. (SPINOZA, 1991, p. xv)
Mas o que são substância, atributo e modo? Para o filósofo em questão, substância é aquilo que tem a existência em si e a concepção por si, não necessitando de outra coisa para ser formado, ou seja, é aquilo que tem essência e existência em si mesmo. Assim, Spinoza confere essa definição para Deus.
Do atributo, podemos dizer que é concebido por si e inteligível em si e para nós (CHAUÍ, 1999). Os atributos são independentes um do outro, porém não sendo independentes da substância que os origina pelo fato de a substância ser em si e para si .
O modo é a sensação da substância, é aquilo que existe na substância e é concebido a partir dela, ou seja, o modo só existe porque existem a substância e o atributo.
Os atributos são divididos em atributos do pensamento e atributos da extensão, e subdivididos em finitos e infinitos. Os modos seguem a mesma divisão da finitude e da infinitude tendo como exemplos o intelecto infinito e a vontade infinita que são modos infinitos e fazem parte do atributo infinito do pensamento; e a quietude, bem como o movimento, fazem parte do atributo infinito da extensão.
Deus possui vários atributos como a eternidade, a infinitude, a unidade, a imensidade, a imutabilidade, a simplicidade e a liberdade.
Deus é eterno porque somente as coisas criadas têm duração, e como Deus é a substância incriada que existe em si mesmo, não tem duração temporal. Assim, Spinoza afirma: “Chamo de eternidade essa existência infinita e só deve ser atribuída a Deus, mas a nenhuma coisa criada, mesmo que sua duração seja ilimitada nos dois sentidos.” (SPINOZA, 1991, p. 18).
Para Spinoza, Deus é a essência que intervém na existência de todas as coisas. Ele afirma que as coisas criadas são assim chamadas por não possuírem essência em si mesmas e está aqui à diferença entre Deus e as coisas: Deus é perfeito e incriado, sua essência coincide com sua existência; já as coisas são finitas e criadas, sua essência depende da existência de Deus. Tudo o que existe tem sua causa final em Deus porque a existência só acontece a partir de Deus, portanto a eternidade é um atributo somente de Deus.
O Deus spinoziano é infinito por ser perfeito e essa perfeição deriva da impossibilidade de distinguir sua essência de sua existência e de lhe atribuir duração; se fizéssemos tal distinção, estaríamos falando da existência de Deus e não de sua essência, conforme afirma Spinoza:
[…] somente Deus pode ser dito absolutamente infinito, enquanto percebemos que ele consiste realmente numa perfeição infinita […]. Donde se segue que a infinidade de Deus, a despeito do vocábulo, é o que há de mais positivo, pois dizemos que é infinito enquanto nos referimos à sua suprema perfeição. (SPINOZA, 1991, p. 19).
Spinoza atribui a Deus a liberdade. Para Spinoza, a liberdade não está relacionada com livre-arbítrio e sim com os efeitos que uma determinação exterior possa provocar através da coação na essência do ser. Assim, Deus é livre no sentido de que sendo essência e existência não necessita de outra substância para existir, o que não acontece com o ser humano, pois ele só existe pela vontade de Deus.
A unidade de Deus é tratada por Spinoza em dois sentidos: uno e único. Uno pelo fato de ser distinto de outras coisas e único pelo fato de não haver nada que se iguale a sua natureza.
Existe ainda o atributo da imensidade, que está diretamente relacionado com a infinidade de Deus. Segundo Spinoza, erram aqueles que “[…] atribuem a imensidade a Deus enquanto o consideram como uma quantidade, pois tiram tais argumentos das propriedades da extensão para afirmar a imensidade de Deus, e não há absurdo maior do que este.” (SPINOZA, 1991, p. 20). Para Spinoza, Deus é infinito porque é o Ser perfeito e por ser ato puro e, como tal, presente em todos os lugares.
Quanto à imutabilidade, é impossível pensá-la para Deus, visto que Ele é causa de tudo, não existindo nada de natureza igual à de Deus que possa modificá-la.
Em se falando de simplicidade, Deus é simples por não ser de substância composta, mas de uma única substância. Da vida de Deus, pode se dizer que ele mesmo é a vida e isso se dá porque é em si mesmo a essência da vida. Sobre o intelecto de Deus, pode se afirmar sua onisciência, pelo fato de a ciência conter uma perfeição em si e esta ciência perfeita somente pode ser atribuída a um ser perfeito, que é Deus.
Para melhor entendermos os modos, devemos entender a divisão que Spinoza faz entre Deus e o mundo. Ele chama Deus de natureza naturante e o mundo de natureza naturada, ou seja, a primeira é a causa e segunda é o efeito da causa que não está fora da causa, mas a mantém dentro de si. Deve-se entender então Deus como natureza naturante, visto que existe e é concebido em si mesmo expressando uma essência eterna e infinita; e como natureza naturada, tudo o que procede da natureza de Deus não podendo existir nem ser concebido sem Ele.
Para Spinoza, Deus é a substância absoluta, e atributos como intelecto, vontade e amor não podem ser conferidos a ele pelo fato de serem estes modos do pensamento e não da substância.
Portanto, em Spinoza Deus não é um ser metafísico e sim a substância criadora imanente que contem em si atributo e modos sendo geradora do mundo, mas não se tornando parte dele.
Referências
CHAUÍ, Marilena de Souza. Nervura do real: imanência e liberdade em Espinosa. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.
REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da Filosofia: do humanismo a Kant. São Paulo: Paulinas, 1990.
SPINOZA, Benedictus de. Pensamentos Metafísicos. Tradução Marilena Chauí et al. 5. ed. São Paulo: Nova Cultural, 1991. (Os Pensadores)