Edivaldo de Oliveira Ribeiro
Seja filósofo, mas para além da filosofia, seja sempre homem.
(Hume, 1998, p.16)
David Hume nasceu em Edimburgo em 1711. Em 1734, parte para a França e é lá que, ainda muito jovem, escreveu a sua obra principal, o Tratado da natureza humana. Tornando bibliotecário da ordem dos advogados em Edimburgo, realizou uma obra considerável como historiador. Vinculado ao embaixador da Inglaterra na França, viveu de 1763 a 1766 em Paris. É na Escócia que o fim da sua vida é ocupado pela composição de suas últimas obras.
Segundo Hume, aquilo que se apresenta à mente humana e dá origem ao seu conteúdo é denominado “percepção”. Percepções para Hume são as sensações ou faculdades que podem remedar ou copiar as percepções dos sentidos, mas nunca poderão atingir a força e a vivacidade de um sentimento original. Ele a distingue, ainda, dividindo-a em duas classes: impressões e idéias. As impressões podem ser simples ou complexas. As impressões simples ou complexas, assim denominadas, são percepções que se manifestam com maior força ou violência (exemplos de impressões simples: uma cor, um sabor; complexas: uma maçã, além de podermos usar ainda como exemplos as sensações, as paixões e as emoções). As idéias também são classificadas em simples ou complexas, elas são apresentadas como as imagens enfraquecidas que a memória produz a partir das impressões.
A primeira classe de impressões diz respeito à força ou a vivacidade com que as percepções é apresentada à nossa mente, ou seja, quando ouvimos, vemos, sentimos, amamos, odiamos, desejamos ou queremos. As impressões estão mais ligadas aos sentimentos. A segunda classe das idéias diz respeito à ordem e à sucessão temporal com que a mesma se apresenta, em outras palavras, diz respeito às impressões menos vivazes das quais temos consciência quando refletimos sobre qualquer dessas sensações acima mencionadas. As idéias estão mais ligadas ao ato de pensar.
As propriedades que dão origem à associação das idéias são: semelhança, contigüidade no tempo e no espaço e causalidade. Pode-se entender a semelhança pelo fato de a fantasia fazer a associação de uma cópia ao original, devido à semelhança existente entre ambos. A contigüidade no tempo e no espaço pelo fato de a fantasia fazer também uma associação de César a Cícero por causa da contigüidade temporal de ambos e associa o sino ao campanário por causa da contigüidade espacial dos dois e, finalmente, a causalidade – causa e efeito – assim também chamada, o fato de a fantasia associar à ferida a dor pelo fato de ser a dor a conseqüência da ferida.
Com essa última Hume prova que a relação entre causa e efeito não pode ser conhecida a priori, isto é, pelo simples exame dos conceitos implicados na relação, mas somente pela experiência. Diante de um objeto novo, ninguém está em descobrir as suas causas e os seus efeitos, abstraindo-se da experiência e apenas raciocinando sobre eles. Logo a relação da causalidade nasce da experiência. É somente com base na experiência que podemos inferir a existência de uma coisa de outra. Ao recordarmo-nos de termos visto aquela espécie de objeto que denominamos chama e de termos sentido aquela espécie de sensação que denominamos quente temos presente a sua associação constante. Daí chamamos a uma de causa e a outra de efeito, e induzimos da existência de uma a existência do outro. Quanto ao uso do principio de causalidade, homens e animais estão no mesmo plano. O cão evita o fogo, os precipícios, as pessoas estranhas, como faz o homem. O cão não pode formar o principio de causalidade por meio da razão, mas unicamente por meio do hábito. Isto confirma plenamente a doutrina precedente.
Uma conseqüência dessa distinção é a drástica contração da diferença entre sentir e pensar que é reduzida simplesmente ao grau de intensidade: sentir consiste em ter percepções mais vivas (sensações), ao passo que pensar consiste em ter percepções mais fracas (idéias). Resulta-se disso, o fato de toda percepção ser dupla como afirma Reale: “Toda percepção, portanto, é dupla: é sentida (de modo vivo) como impressão e é pensada (de modo mais fraco) como idéia”. (REALE, 2007,p.135)
Fica, portanto, claro que todas as percepções da mente humeana se resolvem nas duas espécies distintas por Hume chamada de impressões e idéias. Hume reafirma esta doutrina no começo das analises sobre a moral: “já foi observado que nada jamais está presente à mente senão suas percepções e que todas as ações de ver, ouvir, julgar, amar, odiar e pensar caem sob essa denominação.” As idéias são semelhantes às impressões em tudo, exceto no grau de vivacidade. Daí toda idéia simples tem uma impressão simples que a ela se assemelha, e toda impressão simples tem uma idéia que lhe corresponde.
Percebe-se, ao aproximar-se do final deste trabalho, que toda idéia é copiada de alguma impressão ou sentimento anterior e, quando não podemos encontrar nenhuma impressão, podemos estar certos de que não há idéia alguma. Devido a isso o fato de não existirem idéias inatas. A nada, portanto, a mente tem acesso, senão à percepção, estando confinada a si mesma.
Referências
HUME, David. Investigação sobre o entendimento humano. Lisboa: Edições 70, 1998.
MONDIN, Battista. Curso de filosofia. São Paulo: Paulinas, 1981.
REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da Filosofia: de Spinoza a Kant. 2.ed.São Paulo: Paulus.2007.
ROVIGHI, Sofia Vanni. História da Filosofia Moderna. São Paulo: Loyola, 1999.
SMITH, Plínio Junqueira, O ceticismo de Hume. São Paulo: Loyola, 1995.