Por Marcelo Henrique N. da Costa*
INTRODUÇÃO
No contexto em que estamos inseridos, marcado fortemente pelo individualismo e pelo utilitarismo, onde as pessoas se relacionam umas com as outras tendo em vista interesses pessoais, faz-se necessário uma análise filosófica que não simplesmente critique as relações na contemporaneidade, mas que dê suporte sólido para fundamentar as relações humanas, dando-lhes um sentido ético. A pensadora alemã de origem Judia, do séc. XX, Edith Stein, discípula de Edmund Husserl, em sua produção filosófica procurou analisar, antropologicamente, as estruturas que compõem o ser humano, na tentativa de fundamentar as relações interpessoais numa perspectiva estrutural e ao mesmo tempo ver a vivência comunitária como necessária para a formação da pessoa humana integral.
Stein traz à baila a discussão da necessidade da transcendência do ser humano, sendo ele dotado de espírito: o nível relacional se dá no âmbito espiritual, onde duas pessoas espirituais transcendem uma em direção à outra para a relação, devido à sua abertura constitutiva. É necessário, pois, investigar como Stein compreende esta estrutura constitutiva do homem e de que forma ela influencia na vida comunitária, facilitando uma vivência ética em relação aos outros e à comunidade em si.
Partindo destes pressupostos, neste presente artigo, temos por objetivo investigar sobre a estrutura da vida comunitária segundo Edith Stein. Para tal fim iniciamos apresentando os pressupostos básicos do pensamento de Stein, bem como a origem do método fenomenológico e o contexto de onde Edith inicia sua produção acadêmica, analisando principalmente a sua concepção de fenomenologia e intersubjetividade. Em seguida, buscamos apresentar a relação entre indivíduo e comunidade, apresentando as estruturas propriamente humanas que levam o homem a ser necessariamente aberto à relação e à comunidade. Por fim, delineamos em que sentido Stein está para além de Husserl em sua subjetividade.
1 CONCEPÇÃO STEINIANA DE FENOMENOLOGIA E INTERSUBJETIVIDADE.
Com o advento da modernidade e o crescimento do Positivismo nasce a Fenomenologia, como contraponto ao psicologismo. A fenomenologia nasce com Edmund Husserl, tendo a intenção de criar um pensamento filosófico com rigor científico que gerasse uma forma de conhecimento sem abrir mão de um método que possibilite um estudo sobre a estrutura do ser humano: sua psique, a alma humana, sem deixar de levar em consideração o físico, tendo o agir humano como uma forma de manifestação que busca seu sentido, isto é o espírito. Assim, estes pressupostos fizeram Edmund Husserl não concordar com essa forma de estabelecer um conhecimento psicofísico, até porque, para o desenvolvimento deste, faz-se necessário o apelo à essência. Por fenomenologia entende-se o estudo dos fenômenos ou das coisas que se manifestam à consciência. Todas as coisas que se manifestam a nós são fenômenos e o grande esforço da filosofia é buscar o sentido das coisas e dos fenômenos que se manifestam.
Edmund Husserl defendia que para compreendermos o sentido dos fenômenos é necessário fazermos um caminho a partir de um método rigoroso: primeiramente partindo da redução eidética, tendo como pressuposto que não nos interessa os fatos, mas sim o seu sentido, a sua essência. Em segundo lugar é necessário a redução transcendental: esta etapa questiona quem e como é o sujeito que busca o sentido das coisas e, a partir deste questionamento compreender as estruturas de corpo, psique e espírito que tornam o homem aberto aos atos receptivos da consciência. Husserl com seu método fenomenológico concebe um distanciamento da existência das coisas, buscando encontrar o sentido, a essência do fato. Neste sentido, entre o aspecto subjetivo e a existência podemos adentrar no pensamento de Edith Stein, pois ela parte do pressuposto de que existe outra possibilidade de compreensão no que diz respeito à relação de essência e existência. Edith Stein participou ativamente do Movimento Fenomenológico no Círculo de Göttingen, fundado em 1907:
Edith Stein vai tomar conhecimento da fenomenologia em 1913, a partir da obra “Investigações Lógicas” de Husserl. Ela, por sua vez, no mesmo ano, logo fará parte dos cursos ministrados por Husserl, bem como do Círculo acima mencionado. Contudo, como característica própria da fenomenologia, por não se tratar de um sistema, há a possibilidade de, mediante o método, haver uma liberdade quanto à sua interpretação. É sobre estas possibilidades de interpretação que, dentro do Círculo, começou a haver uma disparidade quanto à epoché, que desembocou no que ficou conhecido como fenomenologia transcendental e fenomenologia realista. (FARIAS, 2013. p. 24).
Partindo deste pressuposto, Stein iniciará suas contribuições para a fenomenologia: segundo nossa filósofa, não há como separar o processo de epoché daquele que o realiza, pois não existe conhecimento que faça uma cisão com quem o faz. Edith considera o mundo e as pessoas como fenômenos que não podem ser colocados em dúvida, bem como não se pode duvidar da sua própria existência. Aqui compreendemos que apesar de Stein aplicar o método de acordo com Husserl no que diz respeito à intersubjetividade, ou seja, a experiência com os outros, denominada empatia, a filósofa alemã investiga sobre o tema tendo em vista verificar a lacuna deixada por seu mestre Husserl, neste aspecto.
A base para compreendermos o pensamento de Edith Stein no que diz respeito à fenomenologia é adentrarmos nos seus estudos de intersubjetividade. A produção filosófica steiniana é inaugurada com a sua tese de doutorado “Sobre o problema da Empatia”, na qual a filósofa irá se deter em investigar aquilo que Husserl não havia esclarecido nas aulas e conferências que ministrava, sobre a possibilidade de uma experiência com o outro de maneira subjetiva. Assim, desenvolvendo o que Husserl não havia estudado a fundo, Edith Stein inicia sua produção filosófica estudando as relações humanas intersubjetivas:
Em seu curso sobre a natureza e o espírito, Husserl tinha falado sobre um mundo objetivo exterior só pode ser vivenciado intersubjetivamente, ou seja, por uma pluralidade de indivíduos cientes de que eles estavam situados num intercambio cognoscitivo. Assim, presume-se a experiência dos outros. Esta experiência particular, Husserl[…] chama Einfühlung (empatia). No entanto, Husserl não tinha especificado o que era. Esta era uma lacuna que deveria ser preenchida. Eu queria investigar o que era a Einfühlung. (STEIN, 2002. p.30)
Partindo da lacuna deixada por Husserl, Edith Stein desenvolve seus estudos fenomenológicos em torno de uma relação ética com o outro. Stein desenvolve a possibilidade da experiência com o outro através da relação empática: trata-se da apreensão do outro alheio e semelhante a si, ato no qual, se dá livremente e nele o ser humano deixa de ser um mero objeto para ser reconhecido em sua dignidade. A abertura do ser humano, enquanto pessoa, para a relação com os outros é constitutivo do próprio homem. Ele é um ser estruturalmente espiritual e com capacidade de transcender em direção do outro.
Logo, a empatia na concepção steiniana, não é vista somente no nível psicológico, mas como intrínseca ao próprio homem. O próprio conhecimento de si passa primeiramente pelo nível relacional. Assim, filosofia de Edith Stein, no contexto da fenomenologia, gira em torno do estudo de uma visão integrada do homem e das estruturas que o compõe e, principalmente Stein desenvolve um trabalho intenso de estudo ético das relações humanas e da vida em comunidade. Partindo destes pressupostos iniciais, no próximo tópico iremos analisar a relação entre o indivíduo e a comunidade no pensamento steiniano.
2 O INDIVIDUO E A COMUNIDADE: VIVÊNCIA COMUNITÁRIA SEGUNDO EDITH STEIN
Para compreendermos a estrutura da vivência comunitária é necessário levar em consideração que Edith Stein não compreende uma estrutura totalmente separada do indivíduo. Stein defende que apreendendo a estrutura que forma o indivíduo podemos chegar a conhecer melhor a estrutura que engendra a ação coletiva. O ato de estar diante do outro limita o próprio desenvolvimento do ser humano para ambos na relação. Em outras palavras, temos uma relação de comunidade, pois mesmo se tratando de seres livres há uma interdependência. O homem só pode ser pleno quando age em relação ao outro como sujeito dotado da mesma estrutura que a si mesmo, ou seja, a formação como pessoa está intrinsecamente ligada à forma como o homem age com o outro.
Assim, analisando a estrutura constitutiva do ser humano, Stein afirma que no âmbito corpóreo a dimensão pessoal é proporcional à característica física da comunidade, identificada pelas características biológicas dos membros da comunidade. A dimensão psíquica pode ser captada por meio das vivências comunitárias. A dimensão espiritual é manifestada pelo fato da comunidade proporcionar um olhar abrangente para um mundo objetivo e captar seu sentido. Na compreensão de Stein, a comunidade possui um centro vital por meio do qual ela pode agir:
Na medida em que as expressões vitais e ações do sujeito fluem do próprio indivíduo, diz-se que a comunidade possui uma alma. […] Portanto, a comunidade tem a possibilidade de agir a partir de seu centro vital, buscando critérios internos aos seus valores para se colocar diante da realidade que a cerca, ou por aceitar critérios externos pertencentes a outras comunidades, ou grupos que sejam mais amplos e possam favorecer algum tipo de influência em suas ações. (COELHO, 2012. p. 48).
Desta maneira, apesar da vivência comunitária não ser em si constituída originalmente, há um ponto de unidade de vivências individuais por meio dos quais podemos falar de uma corrente de vivências comunitárias, resguardando ainda a individualidade de cada membro, não caindo numa massificação. A vida consciente da comunidade só pode advir de um eu individual e não em massa, é apenas na medida em que os membros da comunidade tomam consciência das suas vivências comunitárias, que a comunidade pode se tornar consciente da sua vida. A comunidade não pode agir por si, mas sim de forma pessoal através dos seus membros. Assim, a vivência comunitária não é meramente uma aglutinação de indivíduos, mas é uma unidade de sentido vivencial entre seus membros. Stein afirma que a comunidade possui uma estrutura ontológica na qual a comunidade é análoga a uma personalidade individual, em suas energias vitais e suas fontes:
Nossa pesquisa anterior nos proporcionou algumas indicações de onde podemos fazer referência. Sabemos já que uma comunidade reúne em si uma pluralidade de sujeitos e que é portadora de uma vida que se realiza através dos sujeitos. Sabemos, também, que a comunidade dispõe de uma força vital da qual se alimenta seu vivenciar, que os indivíduos contribuem para essa fonte de força e eles são alimentados, mas não são obrigados a viverem como membros da comunidade, com toda a força a sua disposição. No vivenciar da comunidade se abre um mundo dotado de sentido. São os indivíduos que com sua atividade espiritual constituem o mundo da comunidade, e embora não é tudo que pertence ao seu mundo individual que entra no mundo da comunidade. (STEIN, 2002. p. 407).
Ao estabelecer a relação de analogia entre o indivíduo e a comunidade, nossa filósofa nos leva a concluir que a relação entre os indivíduos se passa principalmente através de atos sociais, com o qual um se dirige e retorna ao outro, na busca de sentido que se expressa pela fala e pelo deixar-se afetar pelo outro. As vivências individuais contribuem para a constituição das vivências comunitárias: cada indivíduo configura a própria vida comunitária, cada membro experimenta vivências comuns a todos os que compõem a comunidade e também tomam consciência da vivência e do sentimento de pertença a essa mesma comunidade. Neste sentido, há um despertar em cada membro da comunidade de uma responsabilidade para com a comunidade. Cada membro assume sua corresponsabilidade para com o bem estar coletivo da comunidade.
Porquanto, Edith Stein ao analisar as vivências comunitárias, tem diante dos olhos uma visão antropológica de totalidade do ser humano, enquanto ser que é estruturalmente relacional. Assim uma vez que o homem, como indivíduo, reconhece o outro como sujeito, é nesta relação empática que há a garantia de sua plenificação enquanto pessoa humana. É resguardada, assim, a dignidade do ser humano que só se conhece totalmente dentro de um contexto comunitário, não permitindo que ele se torne somente mais um dentro de uma massa, mas resguardando a sua individualidade, ele pode se autoconhecer e assumir uma postura de responsabilidade diante do outro:
“A todo sujeito que apreendo empáticamente numa captação de valor o considero como pessoa cujas vivências se associam em uma totalidade inteligível de sentido. Tudo quanto de sua estrutura vivencial, me traz a intuição plenária, depende da minha própria. No principio é próprio de tal plenitude que toda vivência alheia possa derivar de minha própia estrutura pessoal, […]. Ao empatizar posso vivenciar valores e descobrir estratos correlativos de minha pessoa cujo desvelamento minha vivência originária não ofereceu todavia ocasião.” (STEIN, 2002. p. 198)
A formação da pessoa humana acontece, pois, em um contexto de relacionamentos a partir de um princípio interno onde o homem acolhe em si os valores e os compartilha com os demais membros de sua comunidade. No próximo tópico desenvolveremos um pouco mais sobre a intersubjetividade steiniana e em que sentido ela avança em relação a seu mestre Husserl.
3 A INTERSUBJETIVIDADE STEINIANA PARA ALÉM DE HUSSERL
Nas páginas anteriores desenvolvemos um pouco sobre a concepção steiniana de intersubjetividade e vivência comunitária. Como já havíamos dito anteriormente, Stein desenvolve seu trabalho inicial de pesquisa sobre o problema das relações intersubjetivas, a partir da lacuna deixada por Husserl. Edmund Husserl, em seu projeto fenomenológico, estabeleceu que o sujeito pode ter acesso ao outro por meio do fenômeno da Empatia. Sua discípula Edith Stein tomou para si a missão de aprofundar este tema em sua tese de doutorado “Zum Problem der Einfühlung” (Sobre o problema da empatia). Nesta obra Stein desenvolve que a possibilidade da experiência com o outro através da relação empática, é a apreensão do outro alheio e semelhante a si, este ato se dá livremente e nele o ser humano deixa de ser um mero objeto para ser reconhecido em sua dignidade.
Ao se propor em solucionar a questão da empatia, Edith Stein, procura aprofundar em algo que é constitutivo da pessoa enquanto ser transcendente empático. Em outras palavras, Stein fala da constituição da pessoa como ser espiritual. Neste sentido cada pessoa é convidada a sair de si, a transcender-se em direção do outro. Empatia seria basicamente uma relação de autoconhecimento e de apreensão do outro semelhante a mim. Nas palavras de Edith Stein:
“A apreensão de vivências alheias – sejam sensações, sentimentos ou o que seja – é uma modificação de consciência unitária, típica (ainda que diferenciada de varias maneiras) e requer um nome unitário; para ela temos elegido o termo ‘empatia’, já usual para uma parte dos fenômenos pertencentes a ela; se se o quer manter para o terreno mais restrito se deveria cunhar uma nova expressão para ele mais amplo.” (STEIN, 2002.p. 142).
A base ética do pensamento steiniano é ver o outro enquanto pessoa e não simplesmente um objeto de apreensão da consciência. A empatia leva a pessoa a sair de si mesma para afetar e se deixar afetar pelo outro. Neste sentido, o homem sai de uma relação fundada em interesses pessoais, para se relacionar de maneira ética com o outro. Assim, já se nota o grande avanço de Edith Stein em relação à Husserl: ela se vale do método fenomenológico para defender um tipo de relação humana que resguarde a dignidade da pessoa, onde o outro não é mais um objeto de apreensão da consciência, mas é pessoa alheia e semelhante a mim, pessoa constitutivamente espiritual.
O pensamento de Stein vai para além de Husserl devido ao seu grande interesse antropológico: nossa pensadora tem uma visão de totalidade do ser humano e isto serve de base para todas as suas investigações. “Desta forma, quanto ao método fenomenológico, nossa filósofa discorda da idealidade do conteúdo cognitivo, proposto por Husserl, bem como do distanciamento das perguntas metafísicas acerca da origem do eu cognitivo […].” (FARIAS, 2013.p. 26). Logo, Stein vê o fenômeno da vida psíquica alheia como inegável e se propõe a investigá-la. O outro “alheio” nada mais é que um “outro eu”, que tem a mesma estrutura que a minha, com as mais diversas vivências.
Tratando da empatia como constitutiva da pessoa humana, faz dela uma experiência estruturalmente universal: a pessoa humana é corpo e dentro de suas características fundamentais encontra-se a apreensão que é uma capacidade não psicofísica, mas espiritual. Logo, a empatia é uma apreensão do outro enquanto sujeito espiritual que se transcende. Assim, quando tratamos sobre a intersubjetividade e a empatia não a reduzimos a relação somente à subjetividade, apesar da empatia partir da subjetividade, ela não se limita a ela, pois, a empatia, enquanto estrutura constitutiva própria do homem comporta em si algo de universal:
Aos atos sentimentais onde se descobrem estratos pessoais pertencem também os sentimentos de amor e ódio, gratidão, vingança, ressentimento, etc., sentimentos que tem por objetos a outras pessoas […]. Então, é constitutivo da pessoa própria a apreenção de pessoas alheias. (STEIN, 2002. p. 185)
Em suma, a intersubjetividade steiniana leva até as últimas consequências o método fenomenológico de Edmund Husserl, valendo-se deste para auxiliar numa compreensão mais integrada da pessoa humana e dando um sentido ético às relações interpessoais. O homem na análise steiniana é, conforme sua estrutura constitutiva, necessariamente aberto à relação. Percebe-se claramente que Edith avança em seu pensamento para além de Husserl, nunca negando o pensamento de seu ilustre mestre, mas ampliando as reflexões por ele inacabadas.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste trabalho procuramos introduzir o pensamento da filósofa alemã Edith Stein, apresentando os elementos básicos de sua filosofia e o terreno de onde parte sua reflexão. Stein inicia sua produção filosófica a partir de uma inquietação com relação ao conceito de empatia, que não fora esclarecido nas aulas ministradas por seu mestre Edmund Husserl. Neste sentido, o homem é apresentado como um ser estruturalmente relacional e aberto a empatia para com o outro. Partindo do método fenomenológico, Edith Stein apresenta uma visão integrada e totalizante do ser humano, buscando compreender cada estrutura que o compõe: corpo, alma, psiquismo e espírito. A própria estrutura do ser humano já aponta para a sua necessidade de se relacionar, e isto é a base da reflexão de Stein.
Enquanto ser estruturalmente espiritual, o homem se abre para a vivência comunitária, e cada estrutura que compõe o homem faz dele um ser comunitário. Não há como pensar um indivíduo fora da comunidade, pois o ser comunitário é intrínseco ao homem: cada indivíduo se conhece necessariamente dentro da comunidade, o processo de autoconhecimento, ou de consciência de si, passa pelo nível da relação de um sujeito com o outro semelhante a si, um outro eu. Na relação indivíduo e comunidade se estabelece o ambiente onde a vivência empática pode estabelecer a base para uma vivência ética. A formação da pessoa humana acontece somente dentro de um ambiente relacional comunitário e não há como negar ao homem a relação, pois de certa forma ela é universalizada por ser comum a todos os homens.
Na perspectiva das relações intersubjetivas, Stein se vale exaustivamente do conceito de empatia, que não se trata de uma relação afetiva com o outro no nível da simpatia, mas é um apreender a vivência do outro. É a empatia que proporciona ao homem ser um ser de relações, pois na visão de nossa filósofa, ela é parte constitutiva da pessoa espiritual. Logo, todas as pessoas são seres relacionais através da experiência empática e transcendem em direção ao outro. Assim, compreendemos que Edith Stein dá prosseguimento ao método fenomenológico e avança para além do pensamento de Husserl, buscando compreender as estruturas constitutivas do homem e dando um sentido ético às relações comunitárias.
Em suma, procuramos apresentar a base do pensamento de uma filósofa judia do séc. XX, que viveu e sofreu os horrores da Guerra e soube apresentar fenomenologicamente os princípios que levam o homem a agir de forma ética na sua relação com os outros. Pensando na importância da comunidade para o povo judeu, percebemos implicitamente que Stein defende a necessidade o homem agir em comunidade e assume uma postura de responsabilidade para com o outro e para com a comunidade no qual se está inserido. Concluímos que Edith Stein levou até as últimas consequências aquilo que acreditava, quando ela própria sofre pelo seu povo os males da Guerra. Num contexto de profunda massificação humana, quando a pessoa era tratada como simples objeto de dominação, pensar numa relação que resguarda a dignidade do outro semelhante a si, é de suma importância e toma um sentido mais profundo. De fato, quando as pessoas deixam de reconhecer o outro como um ser semelhante a si, quando se isolam da convivência se deixando levar pelo individualismo, elas negam aquilo que lhes é constitutivo e, consequentemente, negam a si próprias.
Nota:
*Graduando em Filosofia na FAM
REFERÊNCIAS
COELHO, Kátia Gardênia da Silva. A liberdade na relação indivíduo e comunidade segundo Edith Stein. 2012. Dissertação (Mestrado em Filosofia) – Universidade Estadual do Ceará, 2012. Disponível em:<http://www.uece.br/cmaf/dmdocuments/ dissertacoes2012_liberdade_relacao_individuo_comunidade_segundo_edith_stein>. Acesso em: 13 nov. 2013.
FARIAS, Moisés Rocha. A empatia como condição de possibilidade para o agir ético. 2013. 97 f. Dissertação (Mestrado em Filosofia) – Universidade Estadual do Ceará, 2013. Disponível em:
<http://www.uece.br/cmaf/dmdocuments/dissertacoes2013_ empatia_como_condicao_possibilidade_para_agir_etico>. Acesso em: 8 set. 2013.
STEIN, Edith. Sobre el problema de la Empatía. In:______. Obras completas: vol. II. Escritos filosóficos. Etapa fenomenológica. Tradução José Luis Caballero Bono. Madrid: Editorial de Espiritualidad, 2002. p. 55-206.
______. Individuo y comunidad. In:______. Obras completas: vol. II. Escritos filosóficos. Etapa fenomenológica. Madrid: Editorial de Espiritualidad, 2002. p. 432-499.