José Mário Santana Barbosa*
RESUMO: O objetivo deste presente estudo é buscar, na obra de Fílon de Alexandria, aspectos que identificam o seu pensamento a respeito da importância da Filosofia como aspecto indissociável do pensamento judeu. Para isso, será analisada a obra “Sobre la unión con los estudios preliminares”, na qual, por meio de alegorias com as Sagradas Escrituras, Fílon apresenta, entre outros aspectos, a importância da busca pelo conhecimento e, portanto, uma possível justificação para o uso da Filosofia no judaísmo. Após isso, buscar-se-á acrescentar esse estudo com uma reflexão a respeito da distinção feita entre Filosofia e Teologia pelo autor e por pensadores posteriores a ele e as consequências que esse pensamento acarretou e acarreta ao meio acadêmico até hoje. Por fim, será apresentado um breve comentário a respeito da importância do uso da razão para a comunidade judaica, defendido por Jean-Paul Sartre, em sua obra “A questão judaica”, na qual ele defende o judaísmo das ameaças da sociedade francesa “antissemita” após a Segunda Guerra Mundial.
PALAVRAS-CHAVE: Judaísmo. Filosofia. Teologia. Razão. Alegoria.
INTRODUÇÃO
Basicamente em todas as sociedades, desde que o homem passou a questionar-se sobre si mesmo e sobre as coisas ao seu redor, sempre existiu um conflito entre as explicações racional e religiosa para a origem desses e de outros fenômenos. Nesse sentido, posição dianteira adquire a Filosofia Judaica a partir de Fílon de Alexandria, ao indicar uma união imprescindível entre esses polos, para alcançar-se a almejada sabedoria.
A fim de aprofundar melhor essa interessante e até curiosa posição, esse estudo buscará entender melhor quais as origens do pensamento filônico a respeito da importância do uso da Filosofia, como meio para se chegar à sabedoria, amparado sempre em seu método de análise bíblica, as “alegorias”.
Assim, ancorado na obra De congresso eruditionis gratia, na qual, a partir de uma alegoria com um texto do livro do Gênesis o autor discute o ensinamento da história de Abraão, Sara e Agar, buscar-se-á chegar até à origem dessa busca de Fílon, que caracterizaria toda uma sociedade judaica moderna, pautada no uso da razão e na Filosofia. Essa análise será amparada pelo estudo de alguns comentadores e estudiosos do tema e pelo breve estudo de um outro autor judeu, Jean-Paul Sartre, que, defendendo seu povo das ameaças preconceituosas da França pós-Guerra, mostra, entre outros aspectos, a importância do uso da razão para sua cultura.
1 CONHECIMENTO, VIRTUDE E SABEDORIA NA ALEGORIA FILÔNICA
A obra “Sobre la unión con los estudios preliminares” (ou De congresso eruditionis gratia) já começa com uma alegoria. Desde o início, Fílon pauta seu pensamento a partir da interpretação de alguns textos bíblicos da tradição judaica, principalmente a narração do livro do Gênesis na qual é apresentada a história de Abraão, Sara e Agar. Abraão e Sara, casados, judeus bons cumpridores da Lei, não conseguem ter filhos, o que contraria aquilo que o próprio Deus havia dito ao marido: que ele haveria de ter uma descendência incontável e duradoura. Como então compreender o que estava acontecendo? Como buscar um meio para que a obra de Deus continuasse sendo possível e Abraão tivesse um filho?
Sara, sua esposa, vendo a incapacidade de gerar um filho para seu marido, indica a Abrão que se una à sua serva, a egípcia Agar. Isso acontece e, finalmente, Abrão tem um filho, Ismael, ainda que este fosse gerado por sua serva e não propriamente por sua esposa. O início da história é este, e o que poderia ser apenas uma narração histórico-tradicional do fato bíblico ocorrido, em Fílon de Alexandria, ganha um caráter indubitavelmente muito maior.
Fílon traz para a interpretação das Sagradas Escrituras aspectos subentendidos no texto que poderiam passar desapercebidos pelo leitor desatento e inexperiente nessa análise. Para ele, o texto não trata propriamente apenas de pessoas, mas sim de modos de vida, de maneiras de se alcançar a felicidade (que é, no caso, o filho tão desejado).
No literal, é um homem sábio quem migra. Já no alegórico, é uma alma amante da virtude. Ou seja, o sentido literal se restringe a um personagem histórico específico, enquanto o alegórico generaliza as implicações do texto, já que trata de uma alma. Deve-se notar que, mesmo com a apresentação do sentido alegórico, o literal, o homem histórico, não é negado. […] Isso porque, segundo ele [Fílon], toda ou a maior parte da Lei é alegorizada. (RIOS, 2009, p. 96)
Abraão é aquele que deseja alcançar essa felicidade e sabe que ela só pode ser alcançada a partir da sabedoria. E Sara é a figura que representa essa sabedoria, razão pela qual Abrão se une a ela e dela espera obter um filho. Contudo, não é possível que um homem passe do estado da completa “imaturidade” para a plena sabedoria que lhe satisfaça por meio de seus frutos. É por isso que Sara indica a Abraão o caminho que ele deve percorrer: o caminho das virtudes. E é Agar, a serva estrangeira que morava há 10 anos com o casal, que é a representação desse caminho. Embora possa oferecer muito ao patriarca e acrescentar a ele muito conhecimento e crescimento nas virtudes, Agar não pode dar-lhe a plenitude da felicidade, que só é alcançada pela sabedoria, isto é, Sara. Mesmo assim, é necessário que ele percorra esse caminho, caso deseje chegar um dia a ter um filho com Sara, a verdadeira sabedoria.
Diremos que Abraão, quando se apressa a tomar por esposa a criada da sabedoria, significa dizer a instrução acerca da cultura geral, não se esqueça. Moisés o disse, a fé devida à senhora desta; antes, sabe que aquela é sua esposa por lei e eleição, enquanto esta o é por necessidade e pela força das circunstâncias. Tal é o que ocorre com todo amante do aprender, nenhum testemunho é mais verídico a esse respeito que a própria experiência. (FÍLON, De congressu quaerendae eruditionis gratia, XIV, tradução nossa)[1]
Algumas das artes que Agar representa e oferece a Abrão a fim de que ele alcance a virtude são a gramática (a arte de se comunicar bem); a geometria (noções de igualdade e proporção); a astronomia (distinção de caos e cosmos); a retórica (modos de expressar a palavra); a música (conjunto de sons, sinfonia); e a lógica (capacidades de raciocínio e refutação de argumentos). Unindo-se a Agar, Abrão aprende o “saber demonstrativo” do conhecimento, e adquire o esperado “saber prático” da virtude, o que lhe permite, finalmente, unir-se verdadeiramente a Sara (o “saber teórico”, a excelência da sabedoria) e ter com ela um filho (o que acontece com o nascimento de Isaac). Aquele que busca a sabedoria, não pode ficar parado no conhecimento adquirido da união com Agar, ainda que ele seja bom. Deve, sim, unir-se a esta sempre com a consciência de ser realmente casado e, portanto, “amante”, de Sara.
Cada uma destas artes possui, com efeito, seus encantos e poderes de atração determinados, e não falta quem, seduzido por eles, permaneça com elas e se esqueça de seus compromissos com a filosofia. Ao contrário, aquele que se atém fielmente ao combinado, procura tudo, de todas as maneiras, com ânimo de satisfazer a esta. É lógico, portanto, que a sagrada escritura, admirada de sua fé, diga que Sara é a mulher de Abraão também nesta ocasião, quando este toma à criada para satisfazer àquela. (FÍLON, De congressu quaerendae eruditionis gratia, XIV, tradução nossa)[2]
O caminho apresentado por Fílon é bastante instigante: é necessário um conhecimento das ciências (representadas pelas virtudes), para, a partir delas, chegar-se ao conhecimento da Filosofia e, dela, finalmente alcançar-se à sabedoria. É esse caminho que merece destaque.
2 A FILOSOFIA EM FÍLON: CAMINHO PARA AQUISIÇÃO DA SABEDORIA
Dentre as artes apresentadas como caminho para se chegar à sabedoria, destaca-se a Filosofia, como meio mais propício para tal. De fato, na obra de Fílon de Alexandria, ela é apresentada como um caminho “posterior” à aquisição das virtudes citadas (gramática, retórica, geometria…) e “anterior” à união com a verdadeira sabedoria. A Filosofia, nesse contexto, parece funcionar como ponte, que liga Abraão a Sara, a sabedoria ao conhecimento que fora enriquecido pelas virtudes de Agar. Dessa forma, é impossível chegar-se até a essa ponte sem que antes sejam adquiridos os conhecimentos básicos que são advindos da experimentação e da busca pelo conhecimento, da “refinação” dos sentidos e do bom aprendizado de técnicas para o pensar.
Porque a mesma relação que intermedeia entre a inteligência e a sensibilidade, intermedeia entre a ciência e a arte, pois, como foi dito, a alma é em certo modo o sentido dos sentidos (a ciência é a arte das artes). Cada uma das artes, pois, tem tomado para si certas pequenas porções da natureza e nelas concentra sua atenção e seus esforços; a geometria tem escolhido as linhas, a música as notas musicais, por exemplo; ao contrário, a filosofia abarca a natureza toda dos seres, já que seu objeto é este mundo e toda forma visível e invisível da existência. (FÍLON, De congressu quaerendae eruditionis gratia, XXV, tradução nossa)[3]
A Filosofia é, portanto o caminho necessário para a aquisição da sabedoria que, no contexto judaico de Fílon, só pode ser alcançada plenamente com o conhecimento de Deus. Considerá-la como “serva” da Teologia – embora esse termo não tenha sido citado na obra estudada de Fílon – é, pois, dizer que é impossível se chegar à plenitude do saber (a senhora) sem antes percorrer o caminho da união com os conhecimentos específicos e, posteriormente, com a Filosofia propriamente dita. Sabedoria é, antes de mais nada, conhecer a realidade das coisas criadas pela divindade, passando-se inevitavelmente pelo próprio conhecimento de Deus. O caminho apresentado por Fílon é didático e bastante claro. Para se alcançar à sabedoria verdadeira, deve-se chegar primeiro à sua serva (a Filosofia) e, para se chegar a esta, por sua vez, deve-se debruçar no conhecimento adquirido de sua serva (Agar, as virtudes), o caminho indispensável para todos. Esse caminho (e suas mais diversas interpretações) perpassou séculos, e, no cristianismo da Idade Média, ganhou um caráter ainda maior, para justificar a importância da Filosofia como “porta de entrada” da Teologia.
A interpretação dessa passagem[4] constitui o ponto de partida do tratamento da filosofia como “serva da teologia” (ancilla theologiae) na Idade Média, e a ela se reporta ainda a inversão da definição da relação entre ambas por Immanuel Kant com a famosa imagem de que a filosofia, como serva, precede a sua senhora carregando-lhe a tocha e não viria após ela carregando-lhe a cauda do vestido. (PANNENBERG, 2008, p. 18)
E por que a necessidade da Filosofia para esse encontro com a sabedoria? A Filosofia, já no pensamento de Fílon, é caracterizada como aquela responsável por educar o comportamento somático e psicológico daqueles que dela fazem uso, desde a maneira de falar, de se comportar, até a forma de pensar e de argumentar. Ao longo da vida, o homem adquire vícios, paixões “desordenadas” e práticas ruins que lhe acompanham. Portanto, é necessário que, por meio da Filosofia, ele entenda a origem de seus impulsos e possa controlá-los com mais facilidade. Além do mais, faz-se indispensável que todo o conhecimento adquirido no primeiro estágio da busca pela sabedoria seja, por meio da Filosofia, convertido, finalmente, na prática dessas virtudes, o que permite que o homem se relacione bem consigo mesmo e possa estar apto a entender melhor a divindade que o rege e se relacionar melhor com ela.
A filosofia nos ensina o controle do ventre, o controle das partes que estão mais abaixo dele e o controle da língua. Estes controles são considerados convidativos em si mesmos, mas aparecem como mais elevados ainda se são aplicados para honra e serviço de Deus. É necessário, por isso, ter presente a senhora quando nos dispomos a desposarmo-nos com as criadas dela. E atribuamo-nos o nome de esposos delas, mas aquela não se chame simplesmente de nossa esposa, mas seja nossa esposa verdadeira. (FÍLON, De congressu quaerendae eruditionis gratia, XIV, tradução nossa)[5]
3 O USO DA RAZÃO NO JUDAÍSMO
A partir do momento em que o homem começou a usar de sua razão para tentar explicar os fenômenos que o cercavam, o aspecto religioso, que já o acompanhava desde há muito tempo, permanecia latente em suas mentes e influenciava, em muito, essa busca pelo saber. Com muita cautela e até mesmo medo analisava-se a proposta de um uso mais empírico do saber humano, em detrimento da crença nas divindades que cada vez mais perdia seu espaço no campo das respostas aos questionamentos desenvolvidos.
Todavia, em alguns momentos – o que muito tem acontecido ultimamente –, buscou-se a resposta para o seguinte questionamento: como conciliar Filosofia e Teologia, o saber empírico/racional e o saber revelado? “Tertuliano, de fato, foi capaz de escrever isto: ‘Que tem a ver Atenas com Jerusalém? Que tem a ver a Academia com a Igreja?’” (PANNENBERG, 2008, p. 18)
Não é diferente com o Judaísmo. Ao longo de sua história, especialmente após uma “abertura” de suas estruturas, permitindo a entrada do modo racional de ver e pensar o mundo, os judeus dividiram-se nas duas vertentes principais desse questionamento. Uma, conservadora, acreditando que só seria possível o pleno conhecimento das coisas a partir da revelação, vinda de Deus e passada por meio dos profetas; a outra, mais aberta, tentando incluir e justificar o uso da razão, por meio da Filosofia, dentre outras ciências, no intuito de se chegar à “verdadeira sabedoria”.
O uso da razão pelo judeu não exclui, contudo, a fé e a revelação. Muito pelo contrário, o complementa. É nessa perspectiva que surgiu o pensamento de Fílon de Alexandria. Por meio de alegorias, como vimos, ele desenvolve, em sua obra, uma rica conjugação entre Filosofia e Teologia, justificando o uso da razão, inclusive, como meio dado por Deus ao homem, para chegar à sua “completude” espiritual. Aqui, o pensamento judaico adquiriu um importante acréscimo do racionalismo grego, incorporando em sua cultura, a partir deste, os traços que mais lhe diziam respeito.
Desde o primeiro século da Era Cristã os judeus helenófonos de Alexandria tinham principiado a incorporar o platonismo e o estoicismo ao pensamento judaico: Fílon de Alexandria (m. 40 d.C.) levou a aproximação entre o judaísmo e o helenismo a um nível jamais igualado – aliás, fez mais do que qualquer outro pensador monoteísta para integrar a filosofia à Revelação (ou a Revelação à filosofia), pois foi o primeiro a lançar as bases da “Metafísica do Êxodo” (identificação do Deus da Bíblia com o Ser da filosofia grega) e da onto-teo-logia, ao interpretar o Nome divino revelado a Moisés, em Êxodo 3, 14 no sentido de Eu sou o Ser. (DE LIBERA, 2011, p. 195)
Outra característica importante a ser observada é o fato de a filosofia judaica ter se desenvolvido especialmente a partir do surgimento de suas maiores “dissidências”, isto é, o cristianismo e o islamismo. Estes, por sua vez, aceitaram com maior facilidade o pensamento ocidental e utilizaram dele para construírem e embasarem muitas de suas doutrinas, seja pela “fraqueza” de suas crenças recém-nascidas, seja pela influência dos diversos povos que aos poucos foram aderindo a essas religiões. De certo modo, isso obrigou o judaísmo a, aos poucos, fazer o mesmo: “Simplificando, pode-se dizer que a época da filosofia judaica, em hebraico, pertence à história do judaísmo em países da cristandade, e a da filosofia judaica em judeu-árabe pertence ao judaísmo nas terras do Islã” (DE LIBERA, 2011, p. 197).
E esse apelo ao uso da razão, ao invés de diminuir, como seria natural que acontecesse (como parece, inclusive, ter acontecido no islamismo e no cristianismo), no judaísmo ganhou um impulso muito grande a partir da obra de Fílon e de outros filósofos judeus. O judeu passou a se identificar como um povo culto, que supervaloriza o conhecimento nos seus mais variados graus, sem, claro, deixar de lado sua fé e o apreço à revelação.
Assim, pois, a verdadeira vida é a daquele que marcha nas decisões e mandamentos de Deus; daqui se deduz que os atos dos ateus equivalem à morte. Dito está já quais são esses atos: não são outros que os da paixão e dos vícios, de onde nascem as multidões de ímpios e sacrílegos (FÍLON, De congressu quaerendae eruditionis gratia, XVI, tradução nossa)[6]
Jean-Paul Sartre, filósofo judeu do século XX, defende, em sua obra “A questão judaica”, o modo de ser judaico do pensamento antissemita europeu pós-II Guerra Mundial. Entre outros aspectos, Sartre ressalta a importância que o judeu tem para a Europa e o Mundo em geral, dada a sua contribuição nas mais diversas áreas da sociedade. Tudo isso é equiparado ao grande preconceito existente à sua imagem, uma tortura à honra e aos costumes desse povo.
Uma das defesas mais interessantes de Sartre é exatamente a respeito do uso da razão pelo judeu. A partir de sua obra, pode-se perceber com bastante clareza o quanto é importante o uso da razão – logo, da Filosofia –, para o judaísmo. Longe de ter parado no tempo, o pensamento judaico parece ter invertido completamente a posição que ocupava em comparação com os dois troncos religiosos que dele são advindos. Se antes era o judeu quem prezava pelo uso da fé amparada apenas pela crença pura e dogmática, hoje ele é quem assume a dianteira na conjugação filosofia-teologia, sempre partindo do uso primeiro da razão.
O anti-semita reprova do judeu “não criar nada”, ter “espírito destrutivo”. Essa acusação absurda (Spinoza, Proust, Kafka, Darius Milhaud, Chagall, Einstein, Bergson não são judeus?) pôde parecer sedutora porque a inteligência judaica assume facilmente uma postura crítica. […] Foram levantados contra o judeu os poderes irracionais da traição, da raça, do destino nacional, do instinto. […] A defesa do israelita é negar ao mesmo tempo a intuição e o irracional; é eliminar as forças obscuras, a magia, o contra-senso, tudo que não se pode explicar com base nos princípios universais, tudo que deixa entrever tendências à singularidade, à excessão. […] E, nesse sentido, pode-se realmente falar de destruição; mas o que o judeu quer destruir é estritamente localizado, é o conjunto dos valores irracionais que produzem um conhecimento imediato e sem garantias. (SARTRE, 1995, p. 72-73)
CONCLUSÃO
Após esse breve estudo, ficou bastante clara a importância que o uso da Filosofia tem para a comunidade judaica de um modo geral, em especial para o pensamento de Fílon de Alexandria e de toda a cultura israelita que o sucedeu. A partir de Fílon, a Filosofia (e o uso da razão) passou a ser usada como parte integrante e condição sine qua non, para a compreensão do mundo em que vivemos.
Como “serva” da sabedoria, a Filosofia é apresentada, no pensamento filônico, com o grande papel de moldar os indivíduos, no conhecimento das artes e, principalmente, em seu autoconhecimento, a fim de que eles estejam aptos para desfrutarem da sabedoria verdadeira e dela fazerem uso. Aqui, portanto, a Filosofia é apresentada principalmente como um “modo de vida” regrado, coerente e especulativo.
Em toda a obra de Fílon de Alexandria, percebe-se, portanto, um profundo interesse pelo modo racional de explicar o mundo, ainda que esse esteja sempre ancorado em toda uma compreensão fideísta religiosa, como pode ser visto, inclusive, pelo apreço pelo uso das alegorias como forma válida de análise filosófica.
O pensamento que sucedeu a Fílon carregou e carrega marcas claras de sua preferência pelo uso da razão. E o próprio comportamento do judeu frente à sociedade ao longo dos séculos (como comprova Sartre) fez jus a esse modo de ser e de agir. Como “serva”, a filosofia cada vez mais toma a dianteira e abre os caminhos daqueles que buscam pela sabedoria.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
DE LIBERA, Alain. A filosofia medieval. Tradução de Nicolás Nyimi Campanário e Yvone Maria de Campos Teixeira da Silva. 3. ed. São Paulo: Loyola, 2011.
FILÓN DE ALEJANDRÍA. Sobre la unión con los estudios preliminares. Traducción de José María Triviño. Buenos Aires: Acervo Cultural, 1976. Disponível em: <http://www.diostellama.com/pdf/26filondealejandriaobrascompletas.pdf>. Acesso em: 5 out. 2016.
PANNENBERG, Wolfhart. Filosofia e Teologia: tensões e convergências de uma busca comum. Tradução de Nélio Schneider. São Paulo: Paulinas, 2008.
RIOS, Cesar Motta. A alegoria na tessitura de Fílon de Alexandria: estudo a partir da obra filônica com ênfase em Sobre os Sonhos I. Dissertação (Pós-graduação em Letras) – Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2009. Disponível em: <http://www.bibliotecadigital.ufmg.br/dspace/bitstream/handle/1843/ECAP-7NYNSE/disseta__o_cesar_rios___arquivo__nico__com_restri__o_retirada_.pdf?sequence=1>. Acesso em: 9 out. 2016.
SARTRE, Jean-Paul. A questão judaica. Tradução de Mário Vilela. São Paulo: Ática, 1995.
* Bacharelando em Filosofia pela FAM
[1] Diremos que Abraham, cuando se apresta a tomar por esposa a la criada de la sabiduría, es decir, la instrucción acerca de la cultura general, no olvida. Moisés lo dice, la fe debida a la señora de ésta; antes, sabe que aquélla es su esposa por ley y personal elección, en tanto que ésta lo es por necesidad y por la fuerza de las circunstancias. Tal es lo que ocurre con todo amante del aprender, v ningún testimonio más verídico al respecto que la propia experiencia.
[2] Cada una de estas artes posee, en efecto, sus encantos y poderes de atracción determinados, y no faltan quienes, seducidos por estos, permanecen con ellas y se olvidan de sus compromisos con la filosofía. En cambio, aquel que se atiene fielmente a lo convenido, todo lo procura de todas partes con ánimo de complacer a ésta. Lógico es, pues, que la sagrada palabra, admirada de su fe, diga que Sara es la mujer de Abraham también en esta ocasión, cuando éste toma a la criada para complacer a aquélla.
[3] Porque la misma relación que media entre la inteligencia y la sensibilidad, media entre la ciencia y el arte, pues, si, como se dejó antes sentado, el alma es en cierto modo el sentido de los sentidos, (la ciencia es el arte de las artes). Cada una de las artes, pues, ha tomado para sí ciertas pequeñas porciones de la naturaleza y en ellas centra su atención y sus esfuerzos; la geometría ha escogido las líneas, la música las notas musicales, por ejemplo; em cambio, la filosofía abarca la naturaleza toda de los seres, puesto que su objeto es este mundo y toda forma visible e invisible la existencia.
[4] Escrito de Pedro Damião sobre a onipotência divina (De divina omnipotentia), a partir de uma interpretação alegórica que Jerônimo fez de Dt 21, 10-13.
[5] La filosofía nos enseña el control del vientre, el control de las partes que están más abajo de él y el control de la lengua. Estos controles considéranse apetecibles en sí mismos pero aparecerán como más elevados aún si son aplicados para honra y servicio de Dios. Preciso es, por eso, tener presente a la señora cuando nos disponemos a desposarnos con las criadas de ella. Y asignémonos el nombre de esposos de éstas, pero aquélla no se llame simplemente esposa nuestra, sino sea nuestra esposa verdadera.
[6] Así pues, la verdadera vida es la del que marcha en las decisiones y mandamientos de Dios; de lo que se deduce que los actos de los ateos equivalen a la muerte. Dicho está ya cuáles son esos actos: no son otros que los de la pasión y los vicios, de los que nacen las multitudes de impíos y sacrílegos.
#
Gostei excelente